Cotidiano

Por trás das cancelas: o novo modelo de pedágio e o reflexo na vida dos trabalhadores

A relação das próximas concessões e da demissão em massa nas concessionárias


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Há mais de duas décadas a indignação dos paranaenses é latente em relação às tarifas pagas ao trafegar pelas estradas do Paraná. E o novo modelo de pedágio está entre os assuntos mais discutidos nos últimos meses. Além dos valores considerados injustos pela maioria é necessário discutir as consequências do contrato na vida de cada um de nós e os reflexos do fim da concessão no contexto social. Além das modificações na administração das estradas, milhares de pessoas terão que passar por adaptações, como por exemplo, os funcionários das empresas que terão os contratos encerrados. A partir de 2022, o Paraná terá um novo formato de concessão nas rodovias e com as mudanças, a promessa é de que os valores sejam menores nas várias cancelas espalhadas pelo Estado. A proposta garante contratos de 30 anos com as empresas vencedoras da disputa. Vinte Sete praças de pedágios, divididas em seis lotes, que devem passar por um leilão, de forma separada. O maior desconto na tarifa vence, além disso, não há limite para as propostas. Segundo o Governo do Estado, os descontos vão depender da disputa, mas será em média de 40% a 50% em relação às tarifas atuais. As concessionárias que atuam terão os contratos encerrados no fim de 2021. Portanto, até que as novas empresas assumam a administração das rodovias, o governo será responsável pela manutenção e atendimentos de acidentes em estradas estaduais. Já as rodovias federais, ficarão aos cuidados do Governo Federal. De acordo com a Agepar - Agência Reguladora do Paraná, estão concedidos à iniciativa privada 2.505 km de rodovias subdivididas em trechos agrupados em seis lotes, ou seja, seis empresas. MAS E POR TRÁS DAS CANCELAS? As seis concessionárias terão os contratos encerrados e cerca de 2400 funcionários consequentemente também serão desligados, entre servidores diretos e prestadores de serviço independentes. Somente aqui na região Oeste do Paraná, são quase mil trabalhadores. Colaboradores que foram orientados a não tratar publicamente sobre o fim do contrato, entretanto, alguns servidores decidiram explicar qual o sentimento diante de tanta insegurança. Entre os contratados, diversos deles nunca tiveram a experiência de trabalhar em outra empresa anteriormente. Além disso, muitas mulheres foram contratadas na concessionária como estagiárias, em seguida, efetivadas onde permanecem até hoje. Mas a pergunta que assola os trabalhadores é sobre o futuro. Com a nova concessão, como as coisas devem prosseguir? Esses funcionários serão amparados de alguma maneira? Eles já estão preparados para ficar sem emprego? Terão possibilidades para exercer outras funções? De acordo com Silvio Caldas, diretor-superintendente de uma das concessionárias, a demissão ocorrerá somente após o último dia de operação do contrato de concessão, previsto para ser finalizado em 26 de novembro deste ano. Caldas explicou que os desligamentos seguirão todas as regras previstas nos contratos de trabalho dos colaboradores, assim como todas as diretrizes estabelecidas por lei, além dos direitos trabalhistas resguardados. Na concessionária administrada por ele, cerca de 290 profissionais perderão o emprego. A empresa possui ainda quase 800 prestadores indiretos, que também serão impactados com o fim das atividades. "Somente será possível uma mudança de cenário em relação aos desligamentos, se houver a continuidade dos serviços executados pela concessionária, com o seguimento do contrato hoje vigente'', indicou Silvio. Cenário que faz o medo prevalecer. Um dos trabalhadores que vamos chamá-lo de Everaldo dedicou dez anos da vida a uma das concessionárias. Por um tempo, optou por trabalho alternativo, mas retornou ao setor em 2020. Antes mesmo de completar um ano e meio na empresa, será demitido, por conta do processo. Everaldo confessou que se sente inseguro com a mudança, principalmente porque o mercado de trabalho está saturado e não faz ideia de como será o futuro dele e da família. "O preço do pedágio é ruim, mas o serviço é necessário, é nosso trabalho, o nosso ganha pão. Não temos ideia do que vão fazer com a gente, espero que nos contabilizem nessa conta e não criem um caos por mera política," relatou o funcionário. Everaldo ainda vislumbra uma situação muito ruim para quem trafega pelas rodovias e não vai mais contar com assistência ao longo dos quilômetros percorridos. "Se não fizerem uma nova licitação ou novas contratações, imagine como ficará a rodovia sem profissionais como nós, que encaramos o perigo, os riscos e que mesmo sabendo desvencilhar deles, às vezes perdemos nossos colegas de trabalho. Então, se colocarem pessoas que nunca atenderam ocorrências, numa rodovia onde carretas com 50, 60 ou mais toneladas descem a serra a mais de 100 km por hora, vão saber fazer isso". Existem também colaboradores que estão em processo de formação, mas que já se acostumaram com a rotina exigente das concessões. Eles também se preocupam com os próximos passos, é o caso de uma outra funcionária que conversamos, e que também prefere não ser identificada. Ela trabalha há dois anos na concessionária, sendo responsável por cinco praças de pedágio e diz que não sabe o que vai fazer quando for demitida, nem qual será seu próximo emprego. "Eu só trabalhei aqui, não sei se vou conseguir uma colocação em outro lugar. A sorte é que ainda sou jovem e dá tempo de correr atrás, mas me preocupo mesmo é com o pessoal mais velho que nunca atuou com outra coisa além daqui". As perguntas são diversas, mas ainda estão sem respostas, o fato é que, os contratos vão encerrar e os pedágios terão novos modelos, mais cancelas, outras pessoas com novas histórias. No Brasil, para demitir sem justa causa não é necessária motivação, mas o funcionário precisa ser amparado e deve receber os valores previstos pela lei. A advogada trabalhista, Julia Paixão, explicou que a lei permite a demissão em massa desde que siga os direitos trabalhistas de uma demissão sem justa causa. Entretanto, há discussões por trás da inconstitucionalidade da mudança de dispositivo que permite a demissão em massa ser equiparada a uma demissão normal, por conta das questões socioeconômicas. "Existe uma proteção quanto a demissão em massa, porque em cidades pequenas, por exemplo, se muitas pessoas são demitidas de uma empresa, isso pode afetar a economia local, portanto a CLT previa uma proteção maior, entretanto em 2017, com a reforma trabalhista a demissão em massa foi equiparada ao desligamento comum". O assunto gera polêmica, é muito discutido e segue esperando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em relação à obrigatoriedade da negociação prévia entre empresas e sindicatos, para casos como esse. Em relação a Cascavel, de acordo com Julia, o impacto não deve ser grande, já que o município tem várias vagas de empregos disponíveis e não depende da concessionária. Os impactos não são dimensionáveis, mas é possível identificar o receio dos atuais funcionários, o medo do incerto, a moeda da sorte jogada ao vento. Façam suas apostas.

Shara Karoliny

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