Ricardo Álvarez e Paulo Lana, professor que orientou a pesquisa até junho de 2022
Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal
Ajoelhado na lama dos mangues da Ilha das Peças, Paraná, e da Praia do Araçá, São Paulo, em 2021, o pesquisador da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Ricardo Álvarez descobriu uma nova espécie de minhoca do mar.
O anelídeo Naineris lanai tem características físicas que a permitem viver em um ambiente aquático quase sem oxigênio. Todas as adaptações do animal impressionaram o professor Paulo Lana, do Centro de Estudos do Mar (CEM) da UFPR.
Estudioso de anelídeos marinhos há décadas, Lana orientou Ricardo Álvarez durante o doutorado na Pós-Graduação em Sistemas Costeiros e Oceânicos (PGSisCo) da UFPR. No entanto, antes da tese ser concluída, Lana morreu aos 66 anos no fim de junho de 2022.
"Paulo sempre me incentivou a olhar as minhocas do mar além da morfologia, pensando na função delas no ambiente", conta Álvarez.
A perda também abalou o universo acadêmico da biologia marinha, visto que, mesmo que sendo um crítico do formato de produtividade científica, o professor era um pesquisador considerado do mais alto nível de produtividade pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Lana era doutor pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da UFPR desde os anos 1980. Na época, estava orientando três doutorandos. "Paulo era uma pessoa que sempre deu suporte aos seus alunos, foi bem paizão. Acreditava no potencial das pessoas, potencial que muitas vezes nós mesmos não conhecemos. Isso é importante quando você é aluno da pós, devido a que muitas vezes a gente tem descobertas legais, mas somos inseguros. É importante que alguém acredite na gente", explica Álvarez.
O biólogo Álvarez, hoje em pós-doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), estava concluindo a tese de doutorado. O trabalho propõe uma reorganização da família Orbiniidae, a de vermes poliquetos (com múltiplas cerdas) que se alimentam de depósitos marinhos, com base no achado de duas novas espécies.
Uma delas, a Naineris lanai, foi batizada em homenagem ao orientador que se encantou com ela. A descrição da minhoca do mar está em um artigo publicado na revista Zootaxa.
O substituto na orientação da tese foi o professor Maikon Di Domenico, do CEM, orientado por Lana no mestrado e no doutorado, e depois colega de trabalho e de conversas longas sobre ciência e docência. "Paulo era especialmente dedicado e preocupado com o desenvolvimento acadêmico de cada aluno e gostava de usar abordagens específicas para cada um", diz Di Domenico.
No Lattes - plataforma em que os cientistas brasileiros mantém os seus currículos acadêmicos - Lana deixou indícios do seu bom humor e temperamento afetuoso.
"Nos últimos anos da minha carreira como cientista e professor, abandonei a perspectiva da ciência incremental e produtivista e passei a provocar meus alunos, em todos os níveis de formação, a ousar mais e a correr riscos científicos, procurando ser mais originais e criativos", explica.
Naineris lanai, minhoca marinha que habita PR e SP
O anelídeo Naineris lanai tem características físicas que a permitem viver em um ambiente aquático quase sem oxigênio. Esses animais são encontrados no litoral paranaense e paulista. As brânquias, como a dos peixes e maiores do que a de outros animais parecidos, permitem que a espécie possa respirar.
Os cílios grandes ao longo do corpo fino servem para empurrar a pouca água disponível em direção às brânquias, garantindo um suprimento de oxigênio mínimo. Todo esse sistema garante que a minhoca de cerca de 25 centímetros de comprimento consiga sobreviver em um ambiente difícil para a maioria dos seres vivos.
Estudo sugere realocar espécies do gênero mais numeroso de poliquetos marinhos
No artigo em que descrevem a espécie Naineris lanai, Álvarez e a pesquisadora norueguesa Nataliya Budaeva, da Universidade de Bergen, que coorientou a pesquisa, ensaiam uma proposta de alterações no gênero Naineris, um dos mais comuns em espécies de minhoca do mar.
Com a ajuda dos laboratórios noruegueses, a dupla confirmou também a presença da espécie Naineris setosa tanto no Brasil como no mar Mediterrâneo, e uma nova espécie do grupo no Oceano Pacífico, a que será descrita em estudos futuros.
Por sugestão do grupo de pesquisa, as espécies do gênero Naineris serão realocadas em outros dois gêneros. Consequentemente as espécies brasileiras pertencentes a Naineris terão que mudar de nome, segundo publicação científica que deve sair em breve.
As revisões taxonômicas — taxonomia é a ciência de classificar os seres vivos — têm sido mais constantes devido ao método de taxonomia molecular, no qual é analisado o DNA do animal e suas semelhanças e diferenças com o de outras espécies.
Redação Catve/Assessoria UFPR
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