Um estudo sem precedentes está desvendando o funcionamento dos olhos das harpias (Harpia harpyja), a maior ave de rapina das Américas. A pesquisa definirá o que é um olho normal para a espécie, parâmetros até agora ignorados pelos cientistas. No futuro, o conhecimento será fundamental para que as harpias sejam reintroduzidas na natureza com mais segurança. Hoje, os animais estão em risco de extinção na América do Sul.
A pesquisa, feita em animais do Refúgio Biológico Bela Vista (RBV), margem brasileira da Itaipu Binacional, é conduzida pelo médico veterinário Wanderlei de Moraes. A perspectiva é que, numa próxima etapa, o programa de Itaipu abarque um plano-piloto de reintrodução de harpias em ambiente natural.
Mas o alcance não será apenas local. A iniciativa pode ser útil para ações como o Programa de Conservação do Gavião-real (outro nome dado às harpias), o PCGR, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. No Brasil, o PCGR é referência no monitoramento de ninhos da espécie nas florestas da Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e Cerrado. Na última década, o programa acompanhou vários indivíduos devolvidos à natureza, todos eles de origem silvestre.
Coleta começou em maio
O trabalho de campo do estudo envolveu uma bateria de exames, feita nos dias 20 e 23 de maio, na qual foram examinadas 21 das 23 harpias do plantel do RBV. Os resultados servirão de subsídio para o projeto e também darão um panorama sobre a saúde das aves do refúgio, que passaram por exames de sangue (hemograma completo).
Na parte oftalmológica, foram conferidas produção de lágrimas, medidas biométricas (tamanho dos olhos) e pressão intraocular (fator que auxilia os olhos a continuarem redondos), além de analisados os tipos e quantidade de bactérias que compõem a microbiota do olho.
A atividade contou com o auxílio de dois pesquisadores - os médicos veterinários Thiago Alegre Coelho Ferreira, mestre em Ciências Veterinárias pela UFPR, e André Tavares Somma, doutorando em Oftalmologia Veterinária pela UFPR.
Visão de longo alcance garante sobrevivência
As aves de rapina são os animais que enxergam melhor no mundo. A acuidade visual garante a caça, a própria sobrevivência e a de seus filhotes. Algumas rapinantes chegam a identificar a presa a 5 mil metros de altura, como no caso da águia-de-asa-redonda (Buteobuteo), que consegue focalizar um pequeno roedor enquanto voa nesta altitude.
Para as harpias a visão não é menos importante. Na natureza, elas constroem seus ninhos a 30 a 40 metros acima do nível do solo, acima da copa das árvores. No RBV, os recintos reproduzem o ambiente - um pouco mais baixo, mas em cativeiro o alimento é garantido.
Se, por um lado, o longo alcance da visão das aves de rapina é de conhecimento público, cada animal tem uma especificidade. Pouco se sabe, por exemplo, das estruturas internas de olhos das harpias, como o "pecten", uma estrutura presente no fundo dos olhos das aves, cuja função ainda não tem consenso entre os cientistas.
Na Itaipu, pela primeira vez os pesquisadores puderam avaliar o fluxo sanguíneo do pecten das harpias, por meio de uma minuciosa ultrassonografia oftalmológica. As descobertas poderão ajudar no detalhamento do funcionamento dos olhos.
Redação Catve.com