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Censo 2024 aponta leve queda na população de onças-pintadas na fronteira Brasil e Argentina

Resiliência da população de onças destaca impacto positivo do trabalho conjunto entre os países


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Na década de 1990, a primeira onça-pintada do Parque Nacional do Iguaçu foi capturada para fins de pesquisa e conservação. Desde então, muita coisa mudou. Nos últimos 20 anos os projetos Yaguareté (Argentina) e Onças do Iguaçu (antigo Carnívoros do Iguaçu) monitoram a população da espécie na região do Corredor Verde, maior núcleo remanescente de onças-pintadas na Mata Atlântica em nível mundial.

O mais recente Censo Binacional de Onças-Pintadas (Brasil-Argentina), realizado em 2024, indica uma estimativa média de 84 indivíduos no Corredor Verde (intervalo de 64 a 110). O número representa uma pequena redução em relação à média de 93 obtida em 2022, mas confirma que a população permanece relativamente estável dentro das faixas naturais de variação para grandes felinos que ocupam áreas extensas.

Uma trajetória de quedas dramáticas e recuperação notável 

Entre 1990 e 1995, estimava-se que o Corredor Verde abrigasse 400 a 800 onças-pintadas. Porém, ao final daquela década, abate, caça e perda de habitat provocaram um declínio alarmante: em 2005, restavam cerca de 40 animais em toda a área, cenário crítico que quase levou a espécie à extinção regional. No Parque Nacional do Iguaçu, apenas 9 a 11 indivíduos foram registrados em 2009. A população dobrou entre 2005 e 2016 (de 40 para aproximadamente 90 onças) e continuou crescendo até 2018. Esse crescimento tem sido possível graças a esforços de numerosas instituições dos dois países, que envolvem desde fiscalização para redução das ameaças, como a caça, até ações de engajamento, coexistência, manejo e pesquisa. Outro fator foi a mudança no uso do solo: muitas propriedades que criavam gado agora se dedicam ao plantio de soja e milho, o que reduziu um pouco os conflitos.

Os censos de 2020 e 2022 indicaram estabilidade, com a estimativa média de 93 onças-pintadas (intervalo 73 - 122) no Corredor Verde e 25 onças (19 - 33) no Parque

Nacional do Iguaçu. O panorama de 2024 reforça a necessidade de vigilância constante, mas mostra que os ganhos obtidos em duas décadas vêm sendo mantidos.

Ações que fazem diferença

Para enfrentar ameaças como o abate por retaliação, o Projeto Onças do Iguaçu e parceiros implementou uma estratégia robusta de coexistência entre grandes felinos e seres humanos. Todos os anos, são realizadas cerca de 350 visitas a propriedades nos dez municípios vizinhos ao parque. A estratégia envolve resposta imediata a casos de predação, implementação de medidas anti-predação e orientação direta à população rural sobre boas práticas de manejo — reduzindo vulnerabilidades e prevenindo retaliações.

O que mostram os dados para o Brasil

No Parque Nacional do Iguaçu, o modelo estatístico aponta 23 onças-pintadas em média (intervalo preliminar de 18 a 30). No entanto, 27 indivíduos diferentes foram fotografados nos três meses de amostragem de 2024 — dois a mais que em 2022.

Esses registros ilustram que o engajamento direto com a comunidade e a pronta resposta aos conflitos contribuem para a persistência da espécie.

Monitoramento de classe mundial

Conduzido desde 2005 a cada dois anos pelos projetos Onças do Iguaçu (ICMBio - Brasil) e Yaguareté (CeIBA - CONICET - Argentina), o censo de 2024 foi o maior já realizado, com 267 estações de armadilhas fotográficas espalhadas por mais de 570 000 hectares de Mata Atlântica — área comparável a quase todo o Distrito Federal. As fotos permitem identificar cada onça pelo padrão único de pintas; modelos matemáticos geram estimativas populacionais confiáveis, usadas para orientar políticas de conservação.

Onde tem onça, tem vida Mesmo diante de desafios complexos, conseguimos manter uma população relativamente estável ao longo dos últimos anos. Isso demonstra que as estratégias de conservação e manejo adotadas estão funcionando. Sem essas medidas, muitos desses felinos não estariam mais aqui", afirma Yara Barros, coordenadora do Projeto Onças do Iguaçu. "A leve queda é um alerta, mas também uma prova de que esforços conjuntos e contínuos podem evitar retrocessos."

A onça-pintada é espécie guarda-chuva: sua proteção salvaguarda a floresta, cursos d’água e inúmeros outros seres vivos — inclusive modos de vida humanos que dependem de ecossistemas saudáveis. Manter essa população viva é um compromisso de longo prazo que envolve ciência, fiscalização, diálogo comunitário e cooperação trinacional.

"Já revertíamos um colapso populacional antes; podemos fazê-lo de novo, desde que mantenhamos o foco nas soluções construídas com quem vive na fronteira da floresta", reforça Agustín Paviolo, do Proyecto Yaguareté. Um novo censo binacional está previsto para 2026, quando será possível avaliar com mais precisão as tendências populacionais da onça-pintada no Corredor Verde.

Assessoria

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