Foto: José Cruz/Agência Brasil
No jargão econômico brasileiro, poucas expressões são tão certeiras quanto "voo de galinha". A imagem é simples: a galinha até tenta voar, consegue sair do chão por alguns instantes, mas logo volta a cair. É um salto curto, limitado, sem sustentação. O termo passou a ser usado para descrever períodos em que a economia brasileira apresenta um repique temporário de crescimento, geralmente impulsionado por estímulos artificiais, seguido por desaceleração, estagnação ou mesmo recessão.
Ciclos econômicos fazem parte da dinâmica natural de qualquer país. Há fases de expansão, pico, desaceleração e contração. O problema do "voo de galinha" é a qualidade do crescimento: ele não nasce de fatores estruturais (produtividade, inovação, investimento privado, ambiente regulatório saudável).
Em vez disso, surge de: Gasto público acelerado, muitas vezes sem contrapartida de reformas; Endividamento elevado, tanto do governo quanto das famílias; Políticas de incentivo de curto prazo, como desonerações pontuais, créditos subsidiados e antecipação de receitas.
Esse tipo de impulso cria uma sensação temporária de prosperidade: consumo sobe, arrecadação melhora, e indicadores macroeconômicos dão a impressão de vigor. Porém, quando o estímulo perde força — porque a dívida pesa, o crédito encarece ou a inflação reage — a economia perde altitude.
E o Brasil está vivendo isso agora Há sinais claros de que sim. Nos últimos anos, a economia brasileira ensaiou uma reação, impulsionada por: Aumento expressivo do gasto público, inclusive com mudanças fiscais que ampliam despesas obrigatórias; Programas de estímulo ao consumo e ao crédito, que elevam o endividamento das famílias; Flexibilização das âncoras fiscais, que reduz a previsibilidade sobre o equilíbrio das contas públicas; Aumento da dívida bruta, que limita a capacidade do Estado de sustentar o crescimento sem pressionar juros e inflação.
O crescimento aparece nas estatísticas, mas não convence. Ele não vem acompanhado de ganho de produtividade, abertura econômica, melhoria do ambiente de negócios ou avanço significativo na formação de capital. É um crescimento que depende da máquina pública — e não das engrenagens privadas.
E qual é o problema disso tudo? Os estímulos artificiais custam caro e não duram.
Quando o governo injeta recursos na economia sem base fiscal sólida, ele está essencialmente puxando demanda do futuro para o presente. Isso significa que mais cedo ou mais tarde será necessário: aumentar impostos, cortar gastos, conviver com juros mais altos, ou aceitar inflação maior.
Todos esses desfechos prejudicam a atividade econômica no médio prazo. Também porque os investidores, especialmente os estrangeiros, não se impressionam com voos de galinha. O que eles buscam são: previsibilidade fiscal, crescimento sustentável, estabilidade institucional, retorno de longo prazo.
Quando percebem que o crescimento está sendo "comprado" com dívida ou gasto público, o recado é claro: não há projeto estrutural de desenvolvimento, apenas um ciclo curto alimentado por estímulos que podem virar contra a própria economia. Resultado: investimentos produtivos são adiados, o câmbio fica mais volátil, o prêmio de risco sobe, e o país perde competitividade.
O Brasil precisa aprender a voar mais alto Romper o ciclo do voo de galinha exige reformas — fiscais, tributárias, administrativas — que melhorem a capacidade do Estado e a eficiência da economia. Exige também disciplina fiscal, segurança jurídica, foco em produtividade, abertura comercial gradual e modernização do mercado de trabalho.
Enquanto o país insistir em crescer pelo atalho do gasto e do crédito fácil, continuará repetindo a história: sobe um pouco, cansa depressa, e pousa antes de chegar a qualquer lugar.
O desafio não é dar saltos curtos.
É sustentar o voo.
Texto de Ayslan Guetner
texto de Ayslan Guetner
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